Você tem medo de quê?
O Instituto Datafolha aponta que, para os moradores de São Paulo, os principais problemas de segurança pública são a falta de policiamento, os assaltos, o despreparo dos policiais, o tráfico de drogas e as leis brandas. No Rio, preocupam mais a falta de policiamento, a corrupção, o tráfico de drogas, as milícias e o despreparo dos policiais
Arthur Trindade M. Costa
Professor de sociologia da Universidade de Brasília e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
O Instituto Datafolha divulgou os dados da sua mais recente pesquisa sobre segurança pública. A pesquisa coletou respostas sobre o medo que os moradores das cidades de São Paulo e Rio de Janeiro afirmam sentir. Sabemos que as estatísticas de medo não necessariamente correspondem às taxas de vitimização criminal. Entretanto, os números nos ajudam a pensar na qualidade de vida nas duas maiores cidades brasileiras.
Segundo o levantamento, o roubo de rua é o crime que mais causa medo entre os moradores das duas cidades: 57% dos moradores de São Paulo e 64% do Rio de Janeiro disseram sentir muito medo de serem assaltados na rua. Em São Paulo, 42% dos moradores declararam ter muito medo de serem assaltados em casa. No Rio de Janeiro esse percentual é de 43%.
A pesquisa também apontou que os homicídios seguem sendo uma das principais preocupações dos cidadãos: 51% dos paulistas e 59% dos cariocas declararam ter muito medo de serem assassinados. O medo de ser atingido por bala perdida afeta mais os moradores do Rio de Janeiro do que os de São Paulo: 60% dos cariocas e 43% dos paulistas têm muito medo de ser atingidos por balas perdidas.
Para os moradores de São Paulo os principais problemas de segurança pública são a falta de policiamento, os assaltos, o despreparo dos policiais, o tráfico de drogas e as leis brandas. No Rio de Janeiro, os entrevistados responderam que os principais problemas são a falta de policiamento, a corrupção, o tráfico de drogas, as milícias e o despreparo dos policiais.
Os dados do Datafolha confirmam as pesquisas sobre medo do crime e vitimização. Os estudos nacionais e internacionais apontam que o roubo de rua é o evento criminal que causa mais medo na população. Eles também mostram que as mulheres são o grupo mais afetado pelo medo de ser roubado, uma vez que esse tipo de crime pode vir associado com outros crimes sexuais.
As pesquisas também mostram que a presença da polícia – especialmente do policiamento de proximidade – e a confiança no trabalho dos policiais são fatores que diminuem o medo. A confiança nas instituições e a satisfação com a qualidade dos serviços públicos também afetam a sensação de segurança.
As pesquisas sobre medo do crime apontam que não há relação entre a vitimização criminal e o medo. Os lugares com maiores taxas de medo não são necessariamente aqueles com maior taxas de criminalidade. Medo e crime são fenômenos autônomos com causas e consequências distintas.
Isso pode ser verificado nos dados apresentados pelo Instituto Datafolha. Há mais de 20 anos a cidade de São Paulo registra a menor taxa de homicídios entre as capitais brasileiras. Em 2020, São Paulo registrou 9,1 homicídios por 100 mil habitantes. Taxa próxima à registrada em Boston (8,3) e Los Angeles (8,8) naquele ano. E inferior às taxas apresentadas em Miami (12,8), Washington (27,8) e Chicago (28,6). Apesar disso, os moradores da cidade seguem declarando ter muito medo de ser assassinados.
O mesmo acontece no Rio de Janeiro, onde o medo de ser vítima de bala perdida vem diminuindo. Em 2018, 84% da população diziam ter muito medo de ser vitimados por bala perdida. O percentual subiu para 85% em 2019 e agora, em 2022, a proporção caiu para 60%. Isso acontece no período em que o número de vítimas de tiroteios aumentou. Segundo o Instituto Fogo Cruzado, em 2020 aconteceram 4.585 tiroteios no Grande Rio, deixando 1.795 baleados – 896 mortos e 899 feridos. Em 2021 o número de tiroteios aumentou para 4.653. Ao todo, 2.098 pessoas foram baleadas (1.084 mortas e 1.014 feridas).
Embora não guardem relação direta com as taxas de criminalidade, os índices de medo do crime afetam significativamente a qualidade de vida nas cidades. O medo faz com que as pessoas evitem lugares e situações, adotem comportamento defensivo, desconfiado e muitas vezes preconceituoso. Em suma, o medo torna a vida urbana mais difícil e menos prazerosa. É o que aponta o levantamento do Datafolha: 59% dos cariocas e 55% dos paulistas disseram que mudariam de cidade se pudessem.
Os números apresentados pela pesquisa devem servir de alerta para as autoridades. É precisa cuidar melhor das nossas cidades, tornando a vida urbana mais segura e prazerosa.