O exemplo da Defensoria Pública de Minas Gerais: a criação de uma ouvidoria externa e verdadeiramente independente
A independência da nova estrutura é vital para que sua atuação não esteja vinculada a pressões institucionais ou políticas, garantindo o recebimento e tratamento adequado das manifestações dos cidadãos
Rodrigo Xavier da Silva
Mestre em Segurança Pública e Cidadania - UEMG; membro titular do Conselho de Criminologia e Política Criminal de Minas Gerais. Associado Sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública - FBSP
A Defensoria Pública desempenha um papel fundamental na promoção do acesso à Justiça em nosso país, especialmente para os mais necessitados e em situação de maior vulnerabilidade. Como afirmado em nossa Constituição Cidadã de 1988, a Defensoria Pública é uma instituição que exerce função essencial à Justiça e desempenha um papel crucial na função jurisdicional do Estado, sendo um pilar do acesso à justiça, da promoção dos direitos humanos e do próprio Estado democrático de Direito (art. 134, CF/1988). Em Minas Gerais, a instituição tem se esforçado para ampliar a sua atuação e estabelecer um diálogo mais efetivo com a sociedade. Nesse contexto, a criação de uma ouvidoria externa da instituição chega em boa hora e representa um passo significativo em direção a uma gestão mais transparente e acessível à sociedade.
Missão e Valores da Defensoria Pública de Minas Gerais
A Defensoria Pública de Minas Gerais possui uma missão clara que orienta suas atividades e ações: garantir o acesso à justiça de forma efetiva, prestando serviços jurídicos de qualidade à população, especialmente àqueles que não dispõem de recursos para arcar com os custos de assistência jurídica privada. Para cumprir essa missão, a Defensoria se fundamenta em um conjunto de valores que refletem seu compromisso com a ética e a responsabilidade social.
Tais valores incluem:
- Atendimento humanizado: priorização do respeito ao ser humano e à sua individualidade, assegurando que todos sejam tratados com dignidade;
- Atuação estratégica e resolutiva na busca por justiça: foco em soluções efetivas e práticas que atendam às necessidades da população;
- Pluralidade e inclusão: valorização da diversidade e promoção da inclusão social em todas as suas ações;
- Transparência: compromisso com a prestação de contas e a abertura para o diálogo com a sociedade;
- Linguagem simples: clareza na comunicação, visando a facilitar a compreensão por parte dos cidadãos;
- Compromisso com a transformação social: busca constante por melhorias nas condições de vida da população e promoção da equidade;
- Promoção da Cidadania e respeito à dignidade humana: defesa dos direitos dos cidadãos e trabalho incessante pela dignidade de todos.
O Cargo de Ouvidor Externo: características e funções
O ouvidor externo da Defensoria Pública de Minas Gerais é um cargo que almeja estabelecer um canal de comunicação direta entre a instituição e a sociedade. Esse profissional tem a responsabilidade de receber sugestões, críticas e reclamações, atuando como um mediador entre a Defensoria e os cidadãos. Além disso, o ouvidor externo atua na promoção de melhorias nos serviços prestados e na identificação de demandas sociais não atendidas. A implementação desse cargo se destaca pela sua estruturação e pelos princípios que regem sua atuação. O ouvidor deve atuar de maneira independente, assegurando a imparcialidade e a legitimidade de suas funções, fundamentais em uma instituição cuja missão é promover os direitos humanos e o acesso à Justiça.
Processo Democrático de Escolha: edital público e regras claras!
Um dos aspectos mais inovadores na criação do cargo de ouvidor externo da DPMG é o seu processo democrático de seleção pública. A Defensoria Pública de Minas Gerais adotou um edital público que estabelece as regras para a seleção do ouvidor (a), garantindo a ampla concorrência e a transparência em todas as fases do processo. Esse edital assegura que qualquer cidadão com as qualificações necessárias possa se candidatar, promovendo um ambiente de inclusão e participação. Todo o processo de escolha do primeiro ouvidor da instituição é regido de forma transparente, por meio da Deliberação 35/2025 e do Edital de Habilitação 01/2025, disponíveis na página eletrônica da instituição[1]. Essas normativas estabelecem diretrizes claras para a seleção, assegurando não apenas a idoneidade do processo, mas também a participação da sociedade civil organizada na escolha de um representante que atue em seu nome. A transparência nas etapas de seleção e a divulgação dos resultados são essenciais para que a sociedade possa acompanhar e confiar nas decisões tomadas.
Iniciativa Pioneira e Independência da Ouvidoria
A criação de uma Ouvidoria da Defensoria Pública de Minas Gerais se destaca não apenas por sua inovação, mas também por ser uma inovação no contexto das instituições do Sistema de Justiça, historicamente refratárias a iniciativas de controle externo. Não há paralelo com outras instituições e poderes, que frequentemente não preveem ouvidorias externas e independentes de suas próprias estruturas. Isso torna a Defensoria Pública de Minas Gerais um exemplo singular de promoção da transparência e da participação cidadã. A independência da ouvidoria é vital para que sua atuação não esteja vinculada a pressões institucionais ou políticas, garantindo o recebimento e tratamento adequado das manifestações dos cidadãos. Essa autonomia permite que a Ouvidoria exerça suas funções sem qualquer tipo de interferência, assegurando a legitimidade da sua atuação. A definição da regra do “mandato” para o exercício do cargo de ouvidor é um recurso importante que oferece estabilidade e continuidade ao trabalho desenvolvido. Essa prática assegura que a atuação da Ouvidoria não fique sujeita a mudanças abruptas decorrentes de alterações na gestão da instituição.
Conclusão
A criação do cargo de Ouvidor Externo da Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais exemplifica uma prática inovadora e necessária para o fortalecimento da democracia e da transparência nas instituições públicas. Por meio de um edital público com regras claras e transparentes, e garantindo a independência do ouvidor, a Defensoria dá um passo significativo no engajamento da sociedade civil organizada em defesa do legítimo direito de acesso à justiça gratuita e de qualidade.
A importância dessa iniciativa da Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais é histórica e merece o reconhecimento devido. Um verdadeiro marco na promoção da responsabilidade institucional e da democracia participativa. Essa proposição “corajosa” representa não apenas um avanço na gestão interna da Defensoria Pública de Minas Gerais, mas também o fortalecimento, ainda maior, da credibilidade da instituição perante a sociedade. Tal iniciativa é pioneira, não havendo paralelo com outras instituições e poderes do estado de Minas Gerais, que não preveem ouvidorias externas e verdadeiramente independentes.
Referências
[1] Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
[2] Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994 – Dispõe sobre a Defensoria Pública da União e dos Estados.
[3] Lei Complementar nº 65, de 16/01/2003, que organiza a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais e define suas competências;
[4] Deliberação 35/2025, da Defensoria Pública de Minas Gerais.
[5] Edital de Habilitação 01/2025, da Defensoria Pública de Minas Gerais.
[1] https://defensoria.mg.def.br/concurso/formacao-de-lista-triplice-para-o-cargo-de-ouvidor/

