Perícia em evidência 15/09/2022

Urnas Eletrônicas: Um caso de Política ou um caso de Perícia?

A abertura do código-fonte a especialistas permite que o sistema seja inspecionado e garantido pela sociedade civil, constituindo-se em atividade obrigatória realizada pelo TSE antes de cada eleição

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Cássio Thyone Almeida de Rosa

Graduado em Geologia pela UnB, com especialização em Geologia Econômica. Perito Criminal Aposentado (PCDF). Professor da Academia de Polícia Civil do Distrito Federal, da Academia Nacional de Polícia da Polícia Federal e do Centro de Formação de Praças da Polícia Militar do Distrito Federal. Ex-Presidente e atual membro do Conselho de Administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

No âmbito político, este é um ano especial e potencialmente problemático. As eleições estão em pauta e um tema tem sido recorrente na mídia, não apenas recentemente, mas pelo menos desde 2020: a segurança das urnas eletrônicas empregadas no processo eleitoral.

Recentemente, a mídia noticiou a divulgação, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de estudos feitos por três importantes universidades públicas brasileiras que avaliaram a segurança das urnas eletrônicas. Nos estudos, considerados independentes, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) testaram os códigos-fonte das urnas, além de realizarem outros exames.

Durante 6 meses os pesquisadores da Escola Politécnica da USP se debruçaram sobre modelos anteriores e modelos mais recentes das urnas eletrônicas, simulando ataques na busca de eventuais fragilidades. Concluíram em seus experimentos “que o modelo novo da urna testado preserva todas as proteções existentes nas versões anteriores, dotadas de hardware de segurança, criando um cenário similar de resistência a invasões quando utilizadas.”. Em tese, os testes mostraram que as urnas seriam invioláveis.

A UNICAMP e a UFPE também se debruçaram sobre os chamados códigos-fonte empregados nas urnas. Para a UNICAMP, dentro dos testes feitos: “nada foi encontrado que possa colocar em dúvida a integridade e confiabilidade do código-fonte da urna eletrônica brasileira”. E que, conforme destaca o  professor Ricardo Dahab, diretor-geral de Tecnologia da Informação e Comunicação da universidade sediada em Campinas, “o relatório conclui que não há código malicioso na urna que vulnere eventual teste de integridade realizado sem identificação biométrica.”

Já a UFPE conclui que os estudos desenvolvidos não identificaram “problemas que comprometam o funcionamento do software”, apresentando, em complementação, algumas sugestões para o “aumento da qualidade do código”. A universidade reiterou  que não há necessidade de alterações urgentes.

Esses estudos são considerados uma perícia? A resposta é não. Eles foram solicitados por demanda do TSE, e tratamos aqui como uma pesquisa e não uma perícia propriamente. Entretanto, segundo informações, a própria Polícia Federal (PF) inicialmente entraria nessa parceria, mas o tribunal e o órgão não finalizaram um acordo. Por isso, a PF está realizando a avaliação do código-fonte das urnas em uma sala montada no TSE, empregando oito peritos criminais especialistas na área de informática. Outras instituições e órgãos também já fizeram essa mesma inspeção dentro do TSE:, a Controladoria-Geral da União (CGU), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e o Senado Federal.

Mas exatamente o que é esse código-fonte? Simplesmente o conjunto de linhas de programação de um software, com as instruções para que o sistema funcione. A sua abertura a especialistas permite que o sistema seja inspecionado e garantido pela sociedade civil, constituindo-se em atividade obrigatória realizada pelo TSE antes de cada eleição, e considerada uma das ações iniciais do Ciclo de Transparência Eleitoral.

Em 2021, a própria Associação dos Peritos Criminais Federais (APCF) foi incluída em uma fake news, manifestando-se através de nota oficial para desmentir tais notícias que davam conta de que “Peritos Federais teriam provado para o Supremo Tribunal Federal (STF) que as urnas eletrônicas eram fraudáveis”.

Em nota, o APCF Sindical afirma que “participou em 2018 de julgamento no STF, oportunidade em que buscou contribuir tecnicamente com as discussões sobre o sistema eleitoral. Na ocasião, defendeu o aprimoramento tecnológico da urna eletrônica, a fim de aumentar ainda mais a sua segurança, ampliando as bases de auditoria. E que em nenhum momento durante o julgamento, porém, a entidade afirmou haver ou ter havido fraudes nas eleições brasileiras. Ao contrário, registra não existir qualquer evidência ou comprovação de que isso tenha ocorrido.

A polêmica, contudo, parece não se encerrar assim tão facilmente. As Forças Armadas, o Partido Liberal (PL), atual partido do presidente Bolsonaro, maior crítico da segurança das urnas, e o Partido Verde (PV) também estão inscritos para analisar os códigos-fonte. Técnicos indicados pelo Ministério da Defesa iniciaram a inspeção dos códigos-fonte das urnas eletrônicas neste mês de agosto.

Não custa lembrar que alguma autoridade pode sempre requisitar uma perícia, desde que haja a previsão legal. Apostamos que são grandes as chances de que ao longo deste ciclo eleitoral isso venha a acontecer. Alguém discorda?

 

 

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