José Roberto Rodrigues de Oliveira
Coronel da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo, ex-chefe de equipe de segurança de governadores do Estado de São Paulo; ex-Chefe da Casa Militar do Governo do Estado de São Paulo, responsável pela segurança pessoal do governador, vice-governador e familiares
No dia 13 de julho de 2024, o mundo pôde assistir, ao vivo e em cores, a um real atentado a uma autoridade de extrema grandeza – um ex-presidente norte-americano na corrida à Casa Branca.
A história traz registros de eventos semelhantes, que redundaram em consequências desastrosas. Recorde-se a morte do arquiduque Francisco Ferdinando, que foi o estopim para a Primeira Guerra Mundial. O nobre da casa Habsburgo-Lorena foi morto por um jovem de 21 anos, Gavrilo Princip.
De pronto, é importante dizer que não existe segurança pessoal 100% eficaz. Basta lembrar que, dos 46 presidentes dos Estados Unidos, 15 sofreram atentado enquanto ocupavam o cargo. Quatro deles morreram. Agora é a vez de um ex-ocupante da Casa Branca ser alvejado.
A agenda de uma autoridade desse quilate é preparada com muita antecedência, num processo que compreende muitas reuniões, definição de papeis e responsabilidades e uma profusão de ensaios que antecedem o evento em si.
Múltiplas agências são envolvidas nesse caso. Círculos concêntricos são estabelecidos, com níveis de responsabilidade que crescem de dentro para fora. Para entender melhor, basta pensar em uma cebola com suas múltiplas camadas; no meio de tudo está a autoridade.
Para um evento como esse, existe o Serviço Secreto, que é responsável pela segurança aproximada. A mais próxima, chamada de cápsula, tem importância gigantesca, e requer treinamento exaustivo. Os círculos mais externos são responsabilidade de agências locais, geralmente ostensivas. A elas cabe a revista de todas as pessoas que vão participar do evento.
Na cena exibida pela TV, os agentes que cercam Trump são parte da cápsula, e a responsabilidade é retirar a autoridade do local, de forma rápida e segura. É necessário que estejam atentos o tempo todo, olhando as mãos de todos que se aproximam. É possível notar, nos vídeos e fotos que circulam na internet, que as mãos desses profissionais que fazem a segurança mais próxima da autoridade estão na altura da cintura, de forma que seja possível sacar a arma ou desarmar alguém que queira atingir o ex-presidente.
É evidente que todas aquelas pessoas que estavam na arquibancada traseira e lateral passaram por uma revista minuciosa, por detectores de metais e por levantamento de registros pessoais que possam antecipar qualquer vulnerabilidade.
O número de agentes e de equipamentos utilizados condizia com a importância e a vulnerabilidade daquele cenário. Entretanto, é necessário formular algumas perguntas e respondê-las.
As fotos mostram que o local de onde o atirador fez o disparo era relativamente baixo e próximo, a cerca de 140 metros de distância. Nota-se, com base na foto aérea divulgada na imprensa, que eram poucos os pontos de cuidado que deveriam ser monitorados ou ocupados.
Lembro-me de que, quando veio ao Brasil o então presidente Bill Clinton, constava em sua agenda um evento no Memorial da América Latina. Como aquele complexo, situado no bairro paulistano da Barra Funda, é cercado por alguns prédios, a solução adotada pela equipe do Serviço Secreto norte-americano foi instalar uma parede de driwall perto do local da parada do carro e da porta acessada por ele.
O que o Serviço Secreto fez foi eliminar a visada de qualquer atirador que estivesse na parte superior dos prédios ao redor do Memorial, dificultando qualquer tentativa de tiro. Não é imprescindível que se levante uma parede. É suficiente um anteparo de lona ou de algum tecido que impeça a mira por parte do atirador. Faltou isso no caso ocorrido neste 13 de julho.
Naquele local da Pensilvânia escolhido para receber o comício, a se tomar por base as fotos disponíveis, não seria necessária uma estrutura muito alta para impedir a visada por parte de qualquer atirador.
Outro fato que me chamou a atenção foi a falta de uma maleta balística ou uma manta balística que pudesse impedir que a autoridade fosse atingida. Num cenário como aquele, mesmo de difícil execução por conta do temperamento de quem estava sendo protegido, ele não poderia ter se exposto novamente, levantando o punho e exibindo o rosto, como fez.
É preciso enaltecer a coragem de todos aqueles que colocam em perigo a vida para a proteção de outra. Nós, que em algum momento da carreira já fizemos essa escolha, estamos na verdade protegendo a vontade de milhões de pessoas que podem escolher essas autoridades para representá-las.