Múltiplas Vozes 09/12/2025

Percepção de risco e tomada de decisão na avaliação e no relato de ameaças: caminhos para prevenir ataques violentos em instituições de ensino

A maneira como professores, gestores e demais membros da comunidade escolar interpretam comportamentos, mensagens, situações ambíguas ou indícios de violência influencia diretamente a qualidade das respostas institucionais

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Hamilton Santos Esteves Junior

Coronel RR Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal especialista em gestão de incidentes

Marcos de Alencar Dantas

Servidor aposentado do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

Um crescimento significativo de episódios de violência em estabelecimentos de ensino no Brasil foi observado nos últimos anos. Esses eventos, embora tenham baixa frequência, produzem impactos profundos e duradouros sobre estudantes, profissionais da educação, famílias e comunidades inteiras. A raridade desses episódios faz com que a percepção da ameaça relacionada a ataques violentos em escolas seja enfraquecida, levando muitos sinais a passarem despercebidos.

A percepção de risco desempenha papel fundamental na prevenção de ataques violentos em estabelecimentos de ensino, pois orienta a tomada de decisão dos profissionais da educação diante de sinais de alerta. A maneira como professores, gestores e demais membros da comunidade escolar interpretam comportamentos, mensagens, situações ambíguas ou indícios de violência influencia diretamente a qualidade das respostas institucionais. Compreender como o risco é percebido e como essa percepção pode ser distorcida é essencial para aprimorar os mecanismos de avaliação e relato de ameaças.

O processo decisório em ambientes escolares sob tensão envolve não apenas a análise objetiva de dados, mas também elementos subjetivos, como experiências anteriores, crenças pessoais, cultura organizacional e níveis de preparo. Quando a percepção de risco é adequada, aumenta a probabilidade de que sinais comportamentais preocupantes sejam identificados e comunicados a tempo, permitindo intervenções preventivas. Indivíduos que contemplam violência muitas vezes exibem comportamentos observáveis, e a próxima tragédia pode ser evitada quando tais sinais são reconhecidos e relatados com responsabilidade, credibilidade e confidencialidade.

Entretanto, a avaliação de ameaças pode ser comprometida tanto pela subestimação quanto pela superestimação do risco. A subestimação ocorre quando sinais relevantes são ignorados, minimizados ou reavaliados como comportamentos normais da adolescência, conflitos passageiros ou brincadeiras sem consequências. Esse fenômeno frequentemente decorre da crença equivocada de que “aqui nunca vai acontecer”, bem como da ausência de protocolos, da falta de treinamento específico ou do receio de estigmatizar estudantes. Tal percepção reduzida impede que informações importantes cheguem às equipes multidisciplinares de avaliação de ameaças, atrasando ou inviabilizando medidas de proteção.

Por outro lado, a superestimação do risco pode levar à interpretação exagerada de comportamentos que não representam ameaça real, resultando em ações desproporcionais, clima de ansiedade generalizada e desgaste institucional. Em contextos escolares, a superestimação pode ser alimentada por episódios recentes de violência amplamente divulgados pela mídia, por datas específicas, por percepções individuais de insegurança ou pela baixa clareza nos critérios de avaliação.

O equilíbrio entre evitar respostas tardias, derivadas da subestimação, e prevenir reações excessivas, decorrentes da superestimação, depende da construção de uma cultura de prevenção sustentada por protocolos claros, formação continuada e canais confiáveis de comunicação interna.

Ao identificar qualquer comportamento ou indício que desperte atenção, o importante é estabelecer uma postura investigativa e preventiva pois reduz o risco de que informações relevantes deixem de chegar às equipes multidisciplinares de avaliação de ameaças, comprometendo a tomada de decisão.

O caso ocorrido em um colégio evidencia, de maneira clara, como a identificação e o monitoramento de sinais precoces são fundamentais para prevenir a evolução de comportamentos preocupantes. Vivenciava fatores de estresse como baixo rendimento escolar, sensação de pressão familiar, isolamento emocional e exposição frequente a conteúdos violentos. A ideação de cometer um ato violento surgiu após a ampla repercussão de um ataque em outro estabelecimento de ensino, demostrando como eventos podem contagiar e influenciar.

Relatos indicaram a presença de elementos como sensação de incapacidade, desejo de expressar sofrimento, planejamento inicial e transporte de armas brancas para a escola, sinais que, quando identificados e comunicados de forma tempestiva, podem orientar ações preventivas fundamentadas.

O relato de ameaças deve ser incentivado, estruturado e protegido por diretrizes institucionais que orientem os profissionais sobre o que observar, como registrar e para quem encaminhar as informações. Quanto maior a clareza sobre o processo, menor a interferência de vieses e maior a qualidade das decisões tomadas.

Em síntese, a percepção de risco e sua relação com a tomada de decisão constituem elementos estratégicos na prevenção de ataques violentos. Ao reconhecer que indivíduos que consideram atos violentos geralmente apresentam sinais identificáveis, a importância do relato responsável e da avaliação criteriosa se fortalece. A gestão adequada desses fatores contribui para mitigar vulnerabilidades, aprimorar a capacidade de resposta e promover um ambiente escolar mais seguro.

A segurança do estabelecimento de ensino se constrói todos os dias, no olhar atento, na escuta sensível e na tomada de decisão responsável. Diante de qualquer dúvida, “não ignore, investigue, faça perguntas”. Essas atitudes podem salvar vidas.

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