Lutas por reconhecimento e os indicadores de racismo e lgbtfobia no Brasil em 2021
As lutas LGBTQI+, negra e indígena obtiveram êxitos distintos em cada setor de política pública. Tais populações alcançaram a formalização de seus direitos na letra da lei, com reivindicações por reconhecimento dos três movimentos
Dennis Pacheco*
Mestrando em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do ABC e pesquisador no Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Em 28 de junho celebramos o Dia Internacional do Orgulho LGBTQI+. Partindo da realidade de que diversas formas de violência e opressão são socialmente impostas contra populações e identidades LGBTQI+, a noção de Orgulho propõe-se enquanto alicerce sobre o qual esses grupos possam afirmar positivamente suas existências, identidades, relações e produções simbólicas e culturais. Está próxima, portanto, da noção de Consciência Negra, celebrada no Brasil em 20 de novembro como marco do valor das identidades e construções e contribuições históricas materiais e imateriais das populações negras no país. Similarmente, o atual Dia do Índio (sic) evoca o valor das identidades, contribuições históricas materiais e imateriais dos povos e populações indígenas no país.
As três datas resultam de longos processos de mobilização e luta em torno do reconhecimento de injustiças direcionadas contra grupos específicos em função das especificidades que os definem ser pessoa, ser LGBTQI+, constituindo datas simultaneamente comemorativas e mobilizadoras de lutas e pautas daqueles que formam seus respectivos movimentos.
As reivindicações políticas por reconhecimento enfrentam problemas sociais relativos ao desrespeito, à dominação e ao apagamento, cuja origem está nas hierarquias institucionalizadas de valor cultural. A hierarquia de valor racista atribui significados positivos às pessoas brancas, seus símbolos e produtos culturais (branquitude) e negativos às pessoas negras, seus símbolos e produtos culturais (negritude), bem como às pessoas, símbolos e produtos culturais indígenas.
Já a hierarquia de valor LGBTfóbica possui duas estruturas distintas, mas complementares de hierarquia de valor, uma que diz respeito à negativação e aos apagamentos físico e simbólico em função de sexualidade, e outra em função de identidade de gênero. Sendo elas:
- a) A cisnormatividade atribui significados positivos às pessoas cis (que se identificam com o sexo atribuído no nascimento), seus símbolos e produtos culturais e negativos às pessoas trans, seus símbolos e produtos culturais.
- b) A heteronormatividade atribui significados positivos às pessoas heterossexuais, seus símbolos e produtos culturais e negativos às pessoas homossexuais, seus símbolos e produtos culturais.
As lutas LGBTQI+, negra e indígena obtiveram êxitos distintos em cada setor de política pública. Tais populações alcançaram a formalização de seus direitos na letra da lei, com reivindicações por reconhecimento de ambos os movimentos convergindo ainda mais explicitamente na decisão do STF, ocorrida em 2019, de reconhecer homofobia e transfobia como parte integrante das práticas punidas enquanto crime de racismo. Apesar disso, a efetivação dos direitos civis à não-discriminação e à vida segue incipiente para os três grupos.
Observando a série histórica, é notável o aumento significativo da cobertura dos dados de violência contra LGBTQI+, racismo e injúria racial desde a primeira coleta realizada pelo FBSP em 2018.
- Texto em versão condensada. Para obter a versão originalmente publicada no Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022, acesse aqui.