Profissão Polícia

Evidências da vitimização feminina no Distrito Federal

Estratégias de policiamento e políticas públicas de segurança precisam, cada vez mais, ser perpassadas pela perspectiva de gênero, com ênfase na vitimização feminina

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Alexandre Pereira da Rocha

Doutor em ciências sociais. Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Em 2021 foram registradas no Distrito Federal 224.820 ocorrências policiais criminais, segundo dados da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF). Ao se considerar os envolvidos dessa amostra, apenas com o recorte de gênero homem ou mulher, praticamente há um equilíbrio na condição de vítima: 50% para cada. Contudo, ao se analisar na  condição de autoria ou suspeito, os homens despontam com 80% dos envolvidos. Nota-se, portanto, que as mulheres são menos propensas ao cometimento de crimes, porém são muito mais expostas à situação de vítima.

A criminalidade possui um componente de gênero, sendo que a mulher é a parte mais atingida. Acrescenta-se que boa parte da violência contra a mulher ainda é cometida no âmbito familiar; pois, por exemplo, cerca de 15 mil ocorrências de violência doméstica são registradas anualmente no Distrito Federal. É triste. O corpo feminino é marcado pelas diversas formas de violências, em graus diversos, conforme o tipo de crime; sobretudo quanto mais simbólico e de cunho sexual.

Desse modo, por exemplo, as mulheres são vítimas de quase 90% dos casos de estupro, sendo que figuram como autoras ou suspeitas em pouco mais de 4% dos casos. Situação similar se observa no crime de importunação sexual, que geralmente ocorre em locais públicos. No recente crime de perseguição, mais conhecido como stalking, 80% das vítimas são mulheres; e cerca de 25% são autoras. No caso de ameaças, as mulheres respondem por quase 60% das vítimas; e aproximadamente 23% das autorias. No crime de roubo a transeunte, 48% das vítimas são mulheres, com 3% delas como autoras ou suspeitas.

Em crimes violentos letais, mesmo as mulheres se envolvendo menos em crimes do que os homens, elas acabam sendo vitimizadas. Assim, nos crimes de homicídio e latrocínio, 11% e 19% das vítimas são mulheres, respectivamente. Ademais, destaca-se a qualificadora feminicídio, que é o assassinato justamente pela condição de mulher, o que no Distrito Federal correspondeu a cerca de 10% das ocorrências de homicídio, em 2021. Nos crimes letais, elas também ocupam a posição de autoras ou suspeitas, sendo 6% e 11% nos homicídios e latrocínios, respectivamente. Todavia, é comum a participação delas em conjunto com homens ou em grupos.

No crime por tráfico de drogas as mulheres responderam por 11% das autorias, em 2021. Contudo, a maioria das mulheres presas é justamente por envolvimento com o tráfico de drogas. A título de exemplo, em 2011, um levantamento apontou que quase 80% das detidas na Penitenciária Feminina do Distrito Federal (PFDF) foram flagradas ao traficarem drogas. O que não é diferente do nível nacional, onde estudos demonstram a continuidade do crime de tráfico de drogas como o principal motivador de encarceramento de mulheres no País, com 59,6%. Ademais, há evidências que boa parte das mulheres que se envolvem com o mercado ilícito de drogas é por conta das atuações criminais de seus parceiros [1]. Com efeito, os motivos que levam as mulheres ao mundo do crime, como autoras, podem ser diferentes dos que animam os homens.

Enfim, a amostra de envolvidos com crimes no Distrito Federal, como vítima ou autor, sugere que as mulheres são os alvos preferidos da criminalidade. Ou seja, elas estão mais sujeitas ao crime, mesmo se envolvendo menos na condição de autoras de delitos. Provavelmente, o corpo feminino é mais alcançado pelo crime não porque seja necessariamente uma parte frágil, mas justamente por ser de mulher. Destarte, estratégias de policiamento e políticas públicas de segurança, cada vez mais, precisam ser perpassadas pela perspectiva de gênero, com ênfase na vitimização feminina.

 

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