Caso Flordelis: Sentença destaca a contribuição da perícia
Além da perícia de local, do corpo (exame cadavérico), da perícia balística da arma de fogo (exame de eficiência e confrontos balísticos), das perícias indiretas em documentação médica, foram realizadas também diversas outras perícias em aparelhos celulares, exames de DNA e exames toxicológicos
Cássio Thyone Almeida de Rosa
Graduado em Geologia pela UnB, com especialização em Geologia Econômica. Perito Criminal Aposentado (PCDF). Professor da Academia de Polícia Civil do Distrito Federal, da Academia Nacional de Polícia da Polícia Federal e do Centro de Formação de Praças da Polícia Militar do Distrito Federal. Ex-Presidente e atual membro do Conselho de Administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Em 16 de junho de 2019 o então companheiro da ex-deputada Flordelis, o pastor Anderson do Carmo, contando 42 anos de idade, foi vítima de um homicídio ocorrido na própria residência do casal, em Pendotiba, bairro de Niterói, cidade inserida na região metropolitana do Rio de Janeiro.
No último dia 13 de novembro, a ex-deputada Flordelis foi sentenciada a 50 anos e 28 dias de prisão. A pastora foi condenada por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio duplamente qualificado, além de uso de documento falso e associação criminosa armada. No mesmo dia, Simone dos Santos Rodrigues, filha biológica de Flordelis, também foi condenada, a uma pena de 31 anos e 4 meses de prisão.
Desde que o caso ganhou repercussão nacional, em especial quando a pastora e ex-deputada foi apontada como mandante do crime, muitas notícias ocuparam as manchetes do noticiário. Em 24 de novembro de 2021, o executor dos disparos, Flávio dos Santos Rodrigues, filho biológico de Flordelis, foi condenado a 33 anos e 2 meses de prisão por homicídio triplamente qualificado, porte ilegal de arma, uso de documento ilegal e associação criminosa armada. No mesmo julgamento, Lucas Cézar dos Santos Souza, filho adotivo da pastora e ex-deputada, foi condenado a 7 anos e meio por homicídio triplamente qualificado. Lucas teria comprado a arma empregada no crime. Sua pena foi reduzida em razão de sua colaboração nas investigações.
Durante o julgamento da ex-deputada, a perícia foi abordada em diversas oportunidades, começando pela perícia do local de crime. Embora o corpo de Anderson do Carmo tenha sido socorrido até um hospital, diversos e importantes vestígios foram coletados na cena, em especial projéteis de arma de fogo e estojos de cartucho deflagrados, elementos que mais tarde foram empregados em exames de confronto balístico realizados com a arma de fogo apreendida na própria casa da família, uma pistola calibre 9mm. A arma foi encontrada durante uma diligência de busca e apreensão realizada pela Polícia Civil e pertencia a Flávio, filho de Flordelis, tendo sido, segundo as investigações, adquirida por Lucas, filho adotivo da pastora.
A necrópsia realizada no corpo de Anderson trouxe outros esclarecimentos: a vítima fora atingida por vários projéteis de arma de fogo, que geraram 30 perfurações. Os disparos causaram laceração (despedaçamento) do encéfalo e fratura da base do crânio. Em razão do número elevado de disparos que atingiram a região da cabeça, a análise do corpo feita pelos peritos legistas não especificou claramente quais os ferimentos eram de entrada e de saída. Uma lesão no pavilhão auricular direito (orelha) foi seguramente identificada como sendo uma lesão de entrada, a qual apresentava orla de tatuagem, indicando disparo efetuado a curta distância. Os tiros também provocaram a laceração dos pulmões, fígado, rim direito e alças intestinais, além de fratura do fêmur esquerdo.
Dentre as diversas perfurações produzidas por projéteis de arma de fogo, pelo menos nove estavam agrupadas na região pélvica, virilha e coxas. Este detalhe pode configurar-se como um elemento simbólico, um vestígio comportamental, sugerindo pela intencionalidade da escolha da região como alvo dos disparos algum tipo de “mensagem”. A investigação mostrou que as relações intrafamiliares eram complexas, com disputas por poder, dinheiro e com um elemento motivacional importante, o ciúme.
As perícias realizadas também buscaram comprovar as tentativas de homicídio contra o pastor e então companheiro de Flordelis. O método empregado envolvia o uso de veneno adicionado a comidas e bebidas servidos à vítima. Neste caso, foram feitas perícias indiretas, em boletins de atendimento médico e prontuários.
Um exame de DNA inusitado e que foi pouco divulgado ajudou também a esclarecer os fatos: durante a diligência de busca e apreensão na residência da família, a polícia encontrou a arma do crime no quarto de Flávio. A defesa alegou que a arma fora plantada, mas quando esta foi examinada foi encontrado um pelo pubiano preso ao ferrolho do armamento. Foram então realizados exames entre esse pelo e o material coletado de uma garrafa e de um garfo utilizados por Flavio na delegacia. O resultado? O pelo era do corpo de Flávio.
Além da perícia de local, da perícia do corpo (exame cadavérico), da perícia balística da arma de fogo (exame de eficiência e confrontos balísticos), das perícias indiretas em documentação médica, foram realizadas também diversas outras perícias em aparelhos celulares, exames de DNA e exames toxicológicos. A contribuição trazida pelas provas técnicas no caso Flordelis foi inquestionável e contundente!