Múltiplas Vozes 02/08/2023

AUMENTO DE CASOS DE SUICÍDIO E DESAFIOS PARA OS ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA

A aproximação dos números de suicídio aos de homicídio aponta para outras faces da violência, o que precisa ser objeto dos órgãos de segurança pública, como as polícias que lidam diretamente com os casos de suicídios

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Alexandre Pereira da Rocha

Doutor em Ciências Sociais (UnB); associado ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP)

O suicídio já é uma das principais causas de mortes no mundo. Particularmente no Brasil, um levantamento do DataSUS verificou incremento de 35% dos casos, entre 2011 e 2020[1]. Conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022, em 2020 foram registrados 13.264 suicídios, passando para 14.353 registros em 2021. Nesse período, enquanto os homicídios tiveram redução de 5,9%, casos de suicídio aumentaram em 8,2%. Embora o suicídio esteja vinculado à saúde pública, os dados alarmantes desses eventos impactam diretamente no trabalho das polícias. É fato. O suicídio também tem se tornado um entrave na segurança pública, especialmente para os setores investigativos e periciais das polícias.

Destaca-se que compete aos órgãos de segurança pública e serviços de emergência realizar os registros de suicídio. Por exemplo, na Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) as ocorrências de suicídio são comunicadas primeiramente às delegacias. Assim, uma equipe da unidade acionada se desloca ao local para avaliação preliminar. Logo em seguida são ativadas as equipes de Preservação de Local de Crime e de Perícia. Por último, a vítima de suicídio é encaminhada ao Instituto Médio Legal (IML), a fim de realizar a perícia no morto. Ainda se instaura inquérito policial para apurar o caso, descartando-se hipóteses de outra causa morte. Além da Polícia Cvil, em geral, são chamadas para atendimento da ocorrência a Polícia Militar, o Corpo de Bombeiro e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).

Figura 1: registros de mortes, por tipos no Distrito Federal. OBS: quantidade de ocorrências policiais, totalizando 2.019 registros. Mortes no trânsito, nesta pesquisa estão agregados homicídios culposos e dolosos no trânsito, acidentes, atropelamentos, outras mortes no trânsito. Em morte suspeita, consta feto localizado. Fonte: DGI/DATE/PCDF

O Distrito Federal não figura entre as unidades federativas nas quais constam as maiores quantidades absolutas de suicídio, todavia, entre as causas de mortes na região, o suicídio está como a terceira maior causa (figura 1). Com efeito, a causa de morte violenta suicídio se aproxima da quantidade de homicídios. Ora, de 2021 para 2022 a causa homicídio reduziu 11,8%, enquanto a suicídio aumentou 23,8%. Nesse período, para cada 10 ocorrências de crimes de mortes, a PCDF teve que apurar 2 casos de suicídio. A média mensal de registros passou de 16 para 19, com uma frequência recorrente ao longo dos dias (figura 2). Como se observa, o aumento de suicídios impacta nas atividades da PCDF, visto que, por se tratarem de mortes violentas, necessitam da atuação dos serviços investigativos e periciais para excluir qualquer possibilidade de outro crime violento.

 

 

 

 

 

Figura 2: Frequência de ocorrências de suicídio, por dia, no Distrito Federal. Fonte: DGI/DATE/PCDF

Em âmbito nacional, também se constata que, na maioria dos estados brasileiros, considerável parte das mortes violentas tem como causa o suicídio. Conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022, em 2020, o número de suicídios já era um terço dos de homicídios (figura 3). Há estados em que os casos de suicídio superam os de homicídio, como Santa Catarina e Rondônia. O comparativo dos dígitos de suicídios com os de homicídios servem como alerta; afinal, o Brasil é o país recordista em quantidade absoluta de homicídios, sendo que em 2020 concentrou 20,5% dos casos conhecidos que foram cometidos no planeta[2]. Com efeito, a aproximação dos números de suicídio aos de homicídio aponta para outras faces da violência, o que precisa ser objeto dos órgãos de segurança pública, como as polícias que lidam diretamente com os casos de suicídios.

 

Figura 3: Comparativo homicídio e suicídio Brasil – 2020. Fonte: ANUÁRIO BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA 2022 (FBSP)

Desse modo, a despeito de a atuação dos órgãos de segurança pública em casos de suicídios não possuir precipuamente caráter preventivo, ela colabora para esclarecimentos das circunstância dos eventos. Por exemplo, por meio das atividades investigativas e periciais se pode avaliar, de forma agregada, o perfil das vítimas, as circunstâncias, os meios empregados para as execuções. A partir disso, é possível observar padrões e frequências de suicídio; conforme pessoas vitimadas, regiões, períodos e correlação com outros eventos. Esses números de suicídio apurados pelos órgãos de segurança pública dizem mais do que tragédias individuais.

O sucídio é um problema de saúde pública no Brasil, o qual traz desafios para diversos setores da sociedade. Para o campo da segurança pública, além das atividades investigativas e periciais, deveriam ser fomentadas ferramentas para melhoria dos registros policiais e o fornecimento de dados estatísticos relacionados aos suicídios, o que é necessário para o conhecimento desse problema social. É fato. O número de suicídios no Brasil já demonstra padrões, o que sugere que esse drama não pode visto somente pelo prisma do indivíduo. Portanto, dados agregados dos boletins de ocorrências, dos inquéritos e das perícias podem dar luzes para a elaboração de políticas preventivas no enfrentamento do suicídio.

 

[1] Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/sites/2/2022/06/anuario-2022.pdf?v=15

 

[2]  Casos de suicídio no Brasil seguem em crescimento. Plural.jor.br. Disponível em:  https://www.plural.jor.br/colunas/focanojornalismo/casos-de-suicidio-no-brasil-seguem-em-crescimento/

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