As eleições e os tipos de propostas para a segurança pública
Propostas de segurança pública são aquelas que, independentemente de conexões com o classismo ou corporativismo, beneficiam diretamente a sociedade, seja pela redução de estatísticas criminais, seja por trazer a sensação de segurança
Lívio José Lima e Rocha
Profissão Polícia
Em tempos pré-eleitorais, sendo “pré” um mero tecnicismo em época de campanhas declaradas, há uma oportunidade de formulação de propostas que, segundo a legislação eleitoral, podem se tornar políticas públicas, caso o candidato seja eleito. Além disso, as propostas modularão o discurso do candidato e suas manifestações em debates ou entrevistas. No caso da segurança pública, um dos temas que são mais caros para a população, é a chance de termos mudanças…ou de mantermos o status quo, se nada efetivo for proposto.
A legislação eleitoral brasileira tem como base a Lei Federal n. 9504, de 30 de setembro de 1997. Essa legislação discorre sobre diversas regras para o jogo eleitoral, como financiamento, pré-campanha, prestação de contas e outros tópicos.
Uma das leis que mais alteraram esse diploma, mudando a redação de diversos artigos e parágrafos, foi a Lei Federal n. 12.034/2009. Destacamos a inclusão do inciso IX no parágrafo 1º do artigo 11, que obriga as candidaturas a protocolar as propostas dos candidatos a prefeito, governador e presidente da República.
Por curiosidade, existem projetos de lei que intentam tornar obrigatório o cumprimento das propostas de campanha como o projeto de lei complementar (PLP) 151/2015, que prevê a inelegibilidade de mandatários dos executivos municipais, estaduais e federal que não tenham cumprido mais da metade das respectivas propostas de governo.
Na prática, os partidos políticos costumam montar grupos de trabalho, formados por interessados e especialistas, para formular uma lista de propostas. Tais propostas são debatidas nos grupos até haver um consenso e repassadas para o comitê central de campanha, que debaterá com o candidato quais as mais interessantes para a propaganda eleitoral, quais serão destacadas e assim por diante.
É comum, no caso específico da segurança pública, termos a presença de acadêmicos, advogados e policiais, ativos ou aposentados, nesses grupos de trabalho que formulam propostas para os candidatos e candidatas. Para os policiais, é uma oportunidade única, porém complexa, de ver mudanças na sua área de atuação.
O problema para os policiais não é saber a realidade da segurança pública, afinal, eles sentem na pele, às vezes literalmente, no seu cotidiano profissional. Dependendo da dedicação do policial e de onde ele trabalhe, pode ser que o fato de ser policial module a visão do mundo em outros temas. O fato de ter exercido ou fazer parte de uma atividade sindical ou associativa da polícia também afeta essa visão. O dilema mais frequente é entender as diferenças e conexões entre propostas classistas, corporativistas e de segurança pública propriamente dita.
Definir esses tipos seria algo adequado para uma extensa pesquisa, possivelmente um objeto de estudo numa pós-graduação, mas o tempo urge, considerando o calendário eleitoral próximo.
Temos como propostas classistas aquelas que beneficiarão somente uma ou algumas carreiras das corporações policiais. As propostas corporativistas são aquelas que trarão somente ganhos para uma instituição policial, seja em recursos humanos, materiais ou poder político. As propostas de segurança pública são aquelas que afetarão as estatísticas criminais ou, pelo menos, a sensação de segurança da população.
Pode parecer complicado classificar as propostas nessas categorias, porém, tem como complicarmos mais: determinadas propostas podem ser transversais e essa transversalidade significa o encontro entre o que os policiais desejam, as corporações policiais desejam e o que a sociedade deseja em segurança pública.
Pensemos numa proposta de aumento salarial para as categorias policiais. É uma proposta classista, que agradará os policiais? Sem dúvida. Ela está atrelada a algum indicador de desempenho? Se sim, como as bonificações por resultado, desde que bem desenhadas, podemos dizer que é uma proposta classista e de segurança pública.
A alteração das atribuições de um corporação policial como, por exemplo, passar a executar as atribuições típicas, porém não restritas, de outra corporação policial ou órgão público de fora da segurança pública é uma proposta meramente corporativista se não vier acompanhada da discriminação de quais benefícios que isso trará para a sociedade. E não será classista se os policiais tiverem esse aumento de atribuições sem a devida compensação remunerada.
Por último, vamos discorrer sobre a categoria mais importante: a de segurança pública propriamente dita. Sem maiores aprofundamentos teóricos, propostas de segurança pública são aquelas que, independentemente de conexões com o classismo ou corporativismo, beneficiam diretamente a sociedade, seja pela redução de estatísticas criminais, seja por trazer a sensação de segurança. Embora estejamos em época de eleições estaduais e nacional, os melhores exemplos de políticas de segurança pública propriamente dita, no nosso raciocínio, são as municipais, pois não possuem as principais forças policiais, civil e militar, como os Estados, e não possuem a competência legislativa para alterar leis que afetam a segurança pública, como a União. Mesmo assim, diversos municípios não se furtam dessa responsabilidade, com iniciativas como o “cerco eletrônico” das cidades, uma extensa rede de câmeras leitoras de placas fiscalizadas pelas guardas municipais que, por sua vez, mantêm contato com as polícias estaduais para os casos suspeitos.
O objetivo dessa classificação não é demonizar ou excluir as propostas classistas e corporativistas das campanhas eleitorais. Os trabalhadores e trabalhadoras da segurança pública precisam aproveitar essa fase de propostas eleitorais para alcançar suas justas demandas. O que a sociedade e os policiais esperam é que haja um equilíbrio entre elas.