Segurança pública nos municípios 18/07/2024

Seguranca pública municipal e Eleições 2024

As eleições municipais de 2024 representam uma nova janela de oportunidades para a priorização do papel destacado que os municípios podem e devem desempenhar no campo da segurança pública

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Eduardo Pazinato

Advogado e Professor Universitário. Mestre em Direito (UFSC) e Doutor em Políticas Públicas (UFRGS). Professor Convidado da Universidade do Chile, Insper e Pontíficia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Associado Sênior e Conselheiro de Administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Ex-Secretário de Segurança e Cidadania de Canoas/RS e ex-Conselheiro Nacional de Segurança Pública

As eleições municipais de 2024 representam uma nova janela de oportunidades para a priorização do papel destacado que os municípios podem e devem desempenhar no campo da segurança pública. A construção de políticas públicas municipais de segurança demanda uma gestão inovadora e uma governança integrada e participativa orientada para a proteção da vida com base em evidência e na conjugação de esforços em prol do controle, da prevenção e, no limite, da redução dos crimes violentos nas cidades.

Não por outra razão, ao longo das últimas três décadas, várias Administrações Públicas ofereceram distintas perspectivas e abordagens no campo da segurança pública municipal. Apesar disso, os resultados alcançados estão longe de serem satisfatórios. Uma análise histórica dos indicadores criminais de vitimização letal (homicídios, feminicídios e latrocínios – roubos seguidos de morte) e de crimes violentos (estupros, roubos em geral e roubos de veículos) dá conta de movimentos erráticos e pendulares de recuos sistemáticos e avanços muito pontuais e esparsos na segurança e na convivência cidadãs.

A prática reiterada de violências e crimes, o aumento da percepção de insegurança e medo nas cidades e a falta de legitimidade e confiança da população nos órgãos de segurança pública transformaram-se em um obstáculo para o desenvolvimento humano no Brasil. O estudo da literatura especializada do país e do exterior, ao lado das melhores práticas nacionais e internacionais revelam o que efetivamente funciona para que os municípios possam contribuir para a prevenção das violências e para a elevação da representação social de segurança no espaço urbano.

Nesse contexto, os municípios, seja qual for seu porte, capacidade financeira e dimensão populacional, precisam valorizar uma concepção alargada de segurança calcada na compreensão de que não haverá direito à segurança sem a segurança dos demais direitos fundamentais e sociais. Dessa forma, precisam contar com o apoio técnico adequado para formular, implementar, monitorar e avaliar uma política municipal integrada e integral de segurança e convivência cidadãs a partir da liderança e do comprometimento do(a) prefeito(a) municipal em torno de políticas de segurança pública centradas na indução do controle e da repressão qualificada da criminalidade violenta combinadas com políticas públicas de segurança com foco na prevenção social e situacional das violências e na promoção dos direitos da população, sobretudo dos segmentos sociais historicamente mais marginalizados, jovens e mulheres, em geral pobres e negros das periferias das cidades brasileiras.

Os municípios podem colaborar com uma integração mais sistêmica entre os órgãos municipais de segurança, a partir das Guardas Municipais (e das demais agências com poder de polícia administrativo), com as demais agências estaduais e federais de segurança pública e justiça criminal (Polícias Civil, Militar, Penal, Perícia, Defensoria Pública, Ministério Público e Poder Judiciário, a convite) é fundamental. A regulamentação tanto da Lei nº 13.022/2014 (Estatuto Geral das Guardas Municipais) quanto da Lei nº 13.675/2018 (“Lei do Sistema Único de Segurança Pública – SUSP”), que regulamentaram, respectivamente, os §§ 7º e 8º do art. 144 da Constituição Federal, também se afigura uma recomendação indispensável para potencializar os resultados esperados com o engajamento do poder local nessa agenda.

Ações estritamente policiais, inclusive aquelas levadas a efeito pelas Guardas Municipais, e de justiça são fundamentais para garantir o controle e a redução da criminalidade violenta, mas não bastam. Intervenções públicas para prevenir social e situacionalmente os fatores de risco e as causalidades que estão na base do cometimento das violências urbanas, como as desigualdades estruturais de raça e gênero, os preconceitos produzidos da socialização primária à secundária – das famílias às escolas, entre outras instituições sociais, a circulação e o rentável comércio ilegal de armas e drogas.

Além disso, são imperiosas melhores regulação e fiscalização administrativa dos espaços públicos e, ainda, a agregação de inteligência e de tecnologia a partir, respectivamente, da estruturação de Observatórios Municipais de Segurança e de Centros Integrados de Comando, Controle, Comunicação e Informação (C4I), para que o Poder Público Municipal possa consolidar o desenho institucional de uma governança integrada e participativa lastreada em dados e informações assertivos acerca da dinâmica das violências e crimes nas cidades.

Dessa forma, os seguintes eixos devem conformar uma política de segurança pública municipal sintonizada com os desafios do séc. XXI:

  • Políticas públicas de segurança com foco na prevenção social das violências e crimes (de que são exemplos os Centros de Referência das Juventudes, Centros de Referência dos Direitos das Mulheres, Casa-abrigo, Promotoras Legais Populares – PLPs, etc.);
  • Políticas públicas de segurança com foco na prevenção situacional das violências e crimes e na regulação e fiscalização administrativa do espaço urbano (C4I, operações integradas entre as agências públicas municipais com poder de polícia administrativo, com destaque para as Guardas Municipais, com os demais órgãos de segurança pública e justiça criminal, iluminação pública, cercamento de terrenos baldios e multas, podas de árvores, pavimentação de vias e outras);
  • Políticas públicas com foco na garantia e na promoção dos direitos humanos (Balcão de Direitos, Núcleos de Mediação Comunitária e Justiça Restaurativa junto às escolas públicas municipais, etc.);
  • Políticas de segurança pública com foco na repressão qualificada das violências e da criminalidade (enfrentamento a grupos de extermínio e desbaratamento de facções criminais com foco no controle e redução de homicídios e crimes violentos, mapeamento e intervenção em crimes cibernéticos e delitos relacionados às violências doméstica e familiar com a participação das Polícias Militar e Civil, Ministério Público, Poder Judiciário e afins);
  • Políticas de gestão de riscos e respostas a desastres humanos e naturais com foco na defesa civil (estruturação de políticas municipais de defesa civil e investimentos de infraestrutura urbana em áreas de risco), medidas indispensáveis em face do enorme impacto das mudanças climáticas, de que são exemplos as enchentes de maio deste ano no Estado do Rio Grande do Sul.

O cabedal de possibilidades que se descortinam para a atuação dos Municípios a partir dessa reconfiguração das políticas públicas de segurança demanda uma estrutura organizacional para permitir a sua operacionalização. A criação de instâncias integradas de gestão e governança, a exemplo dos Gabinetes de Gestão Integradas Municipais (GGI-M), um dos principais legados do finado Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONACI),  para fomentar a indução de uma articulação mais sistêmica das agências municipais direta ou indiretamente vinculadas à possibilidade de dissuadir, prevenir e reduzir a prática de violências e crimes, assim como para coordenar o trabalho em rede entre aquelas e as agências que compõem o sistema de segurança pública e justiça.

Para tanto, as candidatas e candidatos a prefeita(o) devem colaborar proativamente com a construção efetiva do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), com base no preconizado pela Lei nº 13.675/2018 e pela Lei n.º 13.022/2014 (“Estatuto Geral das Guardas Municipais”) – e nos efeitos do reconhecimento da sua plena constitucionalidade pelo STF (ADPF 995). São exemplos de medidas concretas nessa direção:

1. Criação ou fortalecimento da Guarda Municipal com a aquisição de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s), a exemplo de veículos, armamento (letal e de baixa letalidade), sprays, algemas, bastões, drones e afins;

2. Modernização da Guarda Municipal através da adoção e da utilização de dados e informações no patrulhamento municipal preventivo;

3. Regulamentação, no âmbito municipal, da Lei Federal nº 13.022/2014 (Estatuto Geral das Guardas Municipais), em linha com o papel preventivo da Guarda Municipal como a polícia do século XX;

4. Priorização dos territórios e segmentos sociais mais vulneráveis, com destaque para: i. a proteção do entorno escolar; ii. o enfrentamento das violências de gênero e intrafamiliar; iii. a restauração de conflitos entre jovens; iv. a luta contra a prática de violências contra negros e população LGBTI+; v. a intervenção com foco na prevenção de violências contra a população em situação de rua; vi. o estímulo à mediação de conflitos e à justiça restaurativa; vii. a promoção de uma convivência pacífica a partir de um maior controle da perturbação do sossego e da promoção de relações interpessoais não violentas;

5. Realização de operações integradas com foco na fiscalização administrativa e na regulação de estabelecimentos comerciais, com base no fortalecimento do poder de polícia administrativo municipal;

6. Instituição de Procedimentos Operacionais Padrão (POP) da Guarda Municipal, inclusive dos órgãos de controle, interno (Corregedoria) e externo (Ouvidoria) da Guarda Municipal;

7. Institucionalização de “Programa de Saúde Mental da Guarda Municipal”, com pesquisas de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) periódicas, com especial atenção aos suicídios e doenças mentais desses profissionais;

8. Regulamentação do Estudo de Impacto de Seguranca Pública Municipal (EISP-M), previsto no art. 5º, V, do Estatuto Geral das Guardas Municipais;

9. Especialização do patrulhamento municipal preventivo com registros e indicadores específicos

10. Focalização do trabalho da Guarda Municipal como cuidadora da cidade, em linha com políticas publicas de urbanismo social, recuperação de áreas degradas e de riscos (mudanças climáticas).

Vote com e pela segurança dos direitos de todas as pessoas e das cidades!

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