Monitor da Violência 23/08/2023

Queda em nível nacional: o que dizem os dados de homicídios do 1° semestre de 2023

Ainda convivemos com números muito altos de mortes violentas no país, com taxas, por 100 mil habitantes, entre as maiores do mundo, no que diz respeito a comparações internacionais . Foram, em média, 110 assassinatos por dia nos primeiros seis meses de 2023

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Amanda Lagreca

Mestranda em Administração e Governo pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e Pesquisadora no Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Talita Nascimento

Graduada em Gestão de Políticas Públicas pela USP, pós-graduada em Direito Penal e Criminologia Crítica pela Faculdade CERS/Introcrim e Pesquisadora no Fórum Brasileiro de Segurança Pública

No dia 17 de agosto, os dados do Monitor da Violência referentes ao primeiro semestre de 2023 foram divulgados. O Monitor é uma parceria entre G1, Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e Núcleo de Estudos de Violência (NEV-USP). Os dados evidenciam uma continuidade da dinâmica dos homicídios no Brasil, que demonstra queda desde 2018, com um pequeno crescimento em 2020. As Mortes Violentas Intencionais (MVI), categoria criada pelo FBSP e utilizada no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, tiveram o menor valor em 2022 desde 2011, ano em que foi iniciado o levantamento.

Os dados do Monitor dizem respeito aos Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI), categoria que soma os homicídios dolosos (incluindo os feminicídios), latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Aqui, as mortes decorrentes de intervenções policiais (MDIP) não são agregadas. Os dados são monitorados mês a mês pelo G1, através de pedidos via Lei de Acesso à Informação (LAI).

No que diz respeito ao primeiro semestre de 2023, foram 19.742 pessoas assassinadas no Brasil. Em 2022, também no primeiro semestre, foram 20.435 mortes violentas, indicando queda de 3,4%, como mostra o gráfico a seguir. Ainda convivemos com números muito altos de mortes violentas no país, com taxas, por 100 mil habitantes, entre as maiores do mundo, no que diz respeito a comparações internacionais[1]. Foram, em média, 110 assassinatos por dia nos primeiros seis meses de 2023.

Gráfico 1: Evolução de CVLI no primeiro semestre (2019-2023, 1° semestres, Brasil)

 

Fonte: Monitor da Violência (G1, FBSP e NEV)

É importante destacar que a queda não foi homogênea em todas as regiões do Brasil, tampouco nos estados. Dez das 27 Unidades da Federação apresentaram crescimento nos números absolutos de violência letal (Amapá, Acre, Tocantins, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Maranhão e Alagoas). A região Sudeste foi a única com alta nos assassinatos no primeiro semestre deste ano (crescimento de 4,3%), puxada, principalmente, pelo Rio de Janeiro, cujo aumento foi de 17,3%, o segundo maior do país.

Essa alta chama atenção, sobretudo pelos dados divulgados pelo Monitor não incluírem as MDIP, considerando que o RJ é um dos estados com a maior taxa dessas mortes no país. O Espírito Santo apresentou a segunda maior alta da região, com 5%. A única queda no Sudeste foi em São Paulo, com 5,2%.

O Amapá foi responsável pela maior alta em nível nacional na comparação entre o primeiro semestre de 2022 e de 2023, com 65,1%. Na 17ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que analisa as Mortes Violentas Intencionais (MVI), categoria que une as MDIP ao CVLI, o estado apresentou a maior taxa de MVI por 100 mil habitantes em 2022. Embora a comparação semestral do G1, que analisa apenas as CVLI, tenha mostrado queda no Amapá entre o primeiro semestre de 2021 e o de 2022, seu recente aumento tem relação com os conflitos de facções locais, desencadeados pelo homicídio de uma importante liderança no município de Santana, em outubro de 2022, como ressaltaram Samira Bueno (FBSP) e Renato Sérgio de Lima (FBSP).

As principais quedas foram nos estados do Norte, com redução de 6,3% do total, com destaque para Roraima (22,5%) e Rondônia (19,5%), e do Nordeste, cuja redução foi de 5,8%, destacando a Paraíba (22,4%) e Sergipe (19,2%). Os estados do Norte e do Nordeste puxam a queda nacional já que, historicamente, são também aqueles que convivem com altas taxas de mortes violentas. O Centro-Oeste, por sua vez, teve redução de 9,7% na comparação entre o primeiro semestre do biênio.

No que diz respeito ao cenário nacional, o crime organizado tem passado por uma profissionalização a partir da mediação de conflitos e apostas na redução da violência, o que diminui a resolução das desavenças a partir do uso das armas de fogo. Isso não se dá, contudo, de forma homogênea no território nacional, uma vez que os assassinatos variam de acordo com a disputa entre as facções, como verificado no Amapá. As facções criminosas vêm, assim, apostando na redução do conflito armado, com maior racionalidade e na construção de alianças, de forma a se fortalecerem no mercado ilegal de droga, principalmente na exportação de cocaína, como Bruno Paes Manso (NEV) destaca.

Por fim, o que os dados do Monitor da Violência divulgados na última semana nos indicam é a continuidade da queda dos homicídios no Brasil, com particularidades territoriais importantes de serem acompanhadas pelas autoridades estaduais e nacionais. Essas particularidades, como o caso do Amapá ilustra bem, estão, em geral, conectadas com as facções criminosas, de forma que as dinâmicas criminais afetam de forma significativa as configurações de crime contra a vida.

[1] No 16° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicação do FBSP, o Brasil aparece como um dos países mais violentos entre 102 nações. Os dados dizem respeito ao ano de 2020 e estão disponíveis em: https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/sites/2/2022/06/anuario-2022.pdf?v=15, na página 29. Acesso em: 21/08/2023.

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