Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025 25/07/2025

19ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública revela 2,2 milhões de casos de estelionato no país em 2024, com crescimento de 7,8% em relação ao ano anterior

Publicação elaborada pelos pesquisadores do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apresenta análises sobre as principais estatísticas criminais do país em 2024, que também incluem os dados sobre mortes violentas intencionais, violência contra mulheres, violência contra crianças e adolescentes, crimes patrimoniais em geral, entre outros

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Fórum Brasileiro de Segurança Pública

O Brasil passa por uma transformação radical nas dinâmicas da criminalidade e da segurança pública, com a redução de diversos crimes violentos cometidos majoritariamente no espaço público e, em sentido oposto, aumento significativo no número de registros de crimes contra a mulher, crimes sexuais, contra crianças e adolescentes, e de crimes patrimoniais envolvendo fraudes e golpes – muitos dos quais envolvendo aparelhos celulares e o ambiente virtual. Essas são algumas das conclusões da 19ª Edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

O documento elaborado pelos pesquisadores do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) aponta crescimento de 7,8% das ocorrências de estelionato registradas em 2024, que atingiram um total de 2.166.552 casos no período, uma média de quatro golpes a cada minuto no país – aumento de 408% em relação a 2018.

O Anuário também reforça a preocupação com a segurança das mulheres brasileiras, uma vez que várias ocorrências de violência de gênero cresceram, entre as quais destacam-se os números de feminicídios, que registraram recorde desde que o levantamento foi iniciado, com 1.492 mulheres mortas em 2024. Esses números vão na contramão das demais ocorrências violentas e relativas a crimes patrimoniais, que seguem uma tendência de queda ao longo dos últimos anos. No ano passado, 44.127 pessoas foram vítimas de Mortes Violentas Intencionais no Brasil, uma queda de 5,4% na comparação com 2023. O estudo completo pode ser acessado na íntegra pelo link

”Os números desta edição do Anuário explicam por que a população tem na segurança pública hoje a sua principal preocupação. Se caem alguns tipos de crimes violentos, o que é uma boa notícia, há um aumento da insegurança acentuado em espaços que antes eram vistos como protegidos, como as casas e as escolas. E, de igual forma, há uma epidemia de golpes e estelionatos, que, ao que tudo indica, está sob a influência do crime organizado e ainda sem controle por parte das autoridades” avalia o sociólogo Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Somente no estado de São Paulo foram registrados 800 mil casos de estelionato, um terço de todos os registros do país, com uma taxa paulista de 1.744 ocorrências para cada grupo de 100 mil habitantes, bem acima da média nacional de 1.019,2 casos para cada 100 mil habitantes. Em seguida, aparecem Distrito Federal, com taxa de 1.681,3 casos, e o Paraná, com 1.339,5. Os números chamam a atenção tendo em vista que houve uma queda nos números de todos os demais crimes patrimoniais no Brasil. Roubos de veículos apresentaram queda de 10,4% em 2024; já o roubo a residências caiu 19,2% no mesmo período; a transeuntes, 22,6%; no caso das instituições financeiras, redução de 16,6%; a cargas, -14,3%; e a estabelecimentos comerciais, -24,4%. No total das ocorrências de roubos, a queda foi de 51% nas ocorrências se comparamos 2024 com 2018, período anterior à pandemia de Covid-19.

O número de aparelhos celulares furtados ou roubados no Brasil caiu 13,4%, mas segue também em patamares elevados, uma vez que 917.748 aparelhos foram subtraídos em 2024, uma taxa de 431,7 registros desses crimes para cada grupo de 100 mil habitantes. O Anuário mostra que apenas um em cada doze celulares roubados/furtados é recuperado pelas polícias – 8% do total. Alguns estados lançaram programas que favorecem a recuperação/devolução dos aparelhos, mas uma boa parte deles ainda segue sem ações ou programas claros para a recuperação desses celulares.

O estudo também mostra o perfil das ocorrências: 79,6% dos roubos de aparelhos celulares em 2024 ocorreram em via pública; quase 30% dessas ocorrências (29,8%) se dão às quintas e sextas-feiras. No que diz respeito a horários, os picos são entre 6h e 8h e entre 19h e 20h. Entre as vítimas, 59,1% são homens, e mais da metade (52%) está na faixa etária dos 20 aos 39 anos. Mais de 60% (63,1%) das vítimas são negras.

Quanto aos furtos dos telefones celulares, ocorreram em via pública 43,7% dos casos; nos sábados e domingos (34%) e com vítimas mulheres (50,2%). Os horários de picos são às 10h da manhã e entre 17h e 20h.

Mortes Violentas Intencionais (MVI)

O número de mortes violentas intencionais (MVI) caiu 5,4% em 2024, num total de 44.127 vítimas, taxa de 20,8 por grupo de 100 mil habitantes. O índice, criado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), inclui vítimas de homicídio doloso (incluindo feminicídios), roubos seguidos de morte (latrocínio), lesão corporal seguida de morte, mortes decorrentes de intervenções policiais e mortes de policiais em serviço e fora do horário de trabalho. A despeito da redução na violência letal, houve crescimento de 4,9% do número de desaparecimentos (81.873 registros em 2024), o que relativiza a queda nas MVI e sugere uma atenção redobrada por parte do Poder Público sobre o que os dados estão revelando.

A 19ª edição do Anuário trouxe uma versão atualizada do ranking das 10 cidades mais violentas do país com mais de 100 mil habitantes, com forte concentração na região Nordeste, principalmente nos estados da Bahia, Ceará e Pernambuco. Maranguape (CE) ocupa o topo do ranking, com taxa de 79,9 mortes violentas intencionais por 100 mil habitantes, seguida por Jequié (BA), com 77,6; Juazeiro (BA), com 76,2; Camaçari (BA), com 74,8; Cabo de Santo Agostinho (PE), com 73,3; São Lourenço da Mata (PE), com 73; Simões Filho (BA), com 71,4; Caucaia (CE), com 68,7; Maracanaú (CE), com 68,5 e Feira de Santana (BA), com 65,2. No caso dos Estados, as maiores taxas de MVI estão no Amapá (45,1), Bahia (40,6) e Ceará (37,5). As menores são de São Paulo (8,2), Santa Catarina (8,5) e Distrito Federal (8,9). No recorte por regiões, despontam o Norte (277) e o Nordeste (33,8) com taxas de MVI bem superiores à média nacional, enquanto o Sudeste aparece com 13,3; o Sul, 14,6, e o Centro-Oeste figura com 19,5 mortes violentas para cada grupo de 100 mil habitantes.

Para Samira Bueno, Diretora Executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, “os dados apresentados neste Anuário revelam que o Brasil vivencia, desde 2018, uma tendência consistente de queda nas taxas de mortes violentas intencionais. Essa trajetória positiva é reflexo de múltiplos fatores, entre eles a implementação de políticas públicas baseadas em evidências, programas de prevenção à violência, transformações demográficas e alterações nas dinâmicas do crime organizado. No entanto, persistem bolsões de extrema violência, sobretudo em cidades do Nordeste, onde disputas entre facções criminosas seguem produzindo taxas alarmantes de homicídios”.

O perfil das vítimas é muito parecido com o de anos anteriores. Em 2024, a maioria das pessoas assassinadas eram homens (91,1% das ocorrências), negros (79%), pessoas de até 29 anos (48,5%), vítimas de armas de fogo (73,8%) em via pública (57,6%).

Aumento da letalidade policial em São Paulo

Em 2024, 6.243 pessoas foram mortas em confronto com as polícias brasileiros, o que representa 14,1% do total de Mortes Violentas Intencionais do país no período – em 11 anos, entre 2014 e 2024, esse número chega a 60.394 vítimas. São Paulo teve um aumento de 61% nos casos no último ano, puxado sobretudo pela Operação Escudo na Baixada Santista e pelo desmantelamento do programa de câmeras corporais instituído na gestão anterior. Santos e São Vicente estão na lista das 10 cidades com as maiores proporções de letalidade policial em relação ao total de MVI do Brasil e, a cada 10 mortes registradas nestas cidades, mais de 6 (ou 66,1%) foram de autoria de policiais.

No caso dos Estados, as três polícias militares mais letais são as do Amapá (17,1 mortes por 100 mil), Bahia (10,5) e Pará (7,0). No Amapá, um em cada três homicídios registrados no ano passado foi de autoria das forças policiais; na Bahia essa proporção foi de uma morte em cada quatro cometida pelos policiais. Essa proporção não mudou entre 2023 e 2024 para os dois estados, o que sugere a continuação de um mesmo padrão de uso da força letal. Importante também registrar o aumento da letalidade policial em Minas Gerais em 45,5% e no Ceará, em 30,7%.

Ainda segundo Samira Bueno, “o uso da força letal por parte de alguns estados da federação segue sendo um fator estrutural da violência letal no país. Mesmo diante de reduções gerais nas MVI, o Brasil ainda falha em garantir padrões mínimos de controle institucional da ação policial, revelando o peso das escolhas político-institucionais na gestão da segurança pública”.

O Anuário aponta que 170 policiais foram assassinados em 2024. Já o número de policiais civis e militares que tiraram as suas próprias vidas foi de 126, quase o triplo daqueles mortos em serviço (46). Esse dado de suicídios nas corporações aponta para a importância de as forças policiais buscarem cada vez mais programas de apoio psicológico para esses profissionais. Entre os policiais assassinados, predominância pronunciada de homens (98,4% das vítimas) negros (65,4%) vítimas de arma de fogo (93,9% do total de casos).

Violência contra as Mulheres

As estatísticas de feminicídio bateram, novamente, o recorde da série histórica iniciada em 2015, com aumento de 0,7%, na comparação com 2023. No total, 1.492 mulheres foram assassinadas pela sua condição de gênero no período, mantendo a consistência de crescimento dos últimos anos. O perfil das vítimas revela um quadro de ampla vulnerabilidade racial, doméstica e na idade reprodutiva: 63,6% são negras, 70,5% tinham entre 18 e 44 anos, oito em cada dez foram mortas pelos companheiros ou ex-companheiros, e 64,3% dos crimes ocorreram dentro de casa. Quase a totalidade (97%) foi assassinada por homens. O estudo também aponta que, dentre os 18 estados que registram essa informação, cerca de 9% dos feminicídios foram seguidos de suicídio do autor. No caso das tentativas de feminicídio, as ocorrências aumentaram em 19%, com 3.870 casos.

Pela primeira vez, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública analisou os dados de descumprimento de medida protetiva de urgência contra mulheres no Brasil. Os números expõem a continuidade do ciclo de violência contra a população feminina: 18,3% das 555.001 medidas protetivas concedidas em 2024 foram descumpridas pelo agressor, situação que potencializa um amplo contexto de risco imediato para as vítimas.

Outras condutas criminosas contra as mulheres também cresceram em 2024, como stalking (18,2%) e violência psicológica (6,3%). Os dados mostram que a Polícia Militar está sendo cada vez mais demandada por casos de violência doméstica: foram 1.067.556 acionamentos do 190 ao longo do ano, o equivalente a dois chamados por minuto, o que dá uma dimensão do tamanho do problema.

Crimes Sexuais

Entre os 11 indicadores relacionados à violência sexual monitorados nesta edição do Anuário, sete apresentaram crescimento nas taxas de registro em relação a 2023: estupro (ambos os sexos), estupro de vulnerável (ambos os sexos), estupro total (incluindo o estupro de vulnerável) (ambos os sexos), estupro de mulheres, assédio sexual, importunação sexual, pornografia, sendo este último o de crescimento mais expressivo, de 13,1%. Em 2024, o Brasil registrou o maior número de estupros e estupros de vulnerável da série histórica, com 87.545 ocorrências registradas no período. Esse número indica que, a cada seis minutos, uma mulher foi estuprada no país. Do total de ocorrências, 76,8% correspondem ao crime de estupro de vulnerável, 55,6% foram contra mulheres negras e 65% ocorreram dentro de casa. Quase metade dos agressores (45,5%) era composta por familiares das vítimas, e 20,3% eram parceiros ou ex-parceiros íntimos.

A taxa média nacional de estupros e estupros de vulnerável foi de 41,2 por grupo de 100 mil mulheres. Os municípios com as maiores taxas isoladas foram Boa Vista (RR), com 132,7, mais de três vezes acima da média nacional, seguida de perto por Sorriso (MT), com 131,9; Ariquemes (RO), com 122,5; Vilhena (RO), com 108,7; e Porto Velho (RO), com 108,6 para cada grupo de 100 mil mulheres.

Violência contra crianças e adolescentes

Apesar da redução na taxa global de mortes violentas no Brasil, a violência contra crianças e adolescentes continuou crescendo em todas as faixas etárias entre 2023 e 2024, mantendo o padrão verificado nos anos anteriores. As taxas de mortes violentas intencionais tiveram aumento de 3,7% no grupo de zero a 17 anos, com 2.356 vítimas no total. Os dados também mostram recrudescimento nas taxas de todos os outros crimes contra essa população. Houve crescimento de 14,1% da produção de material de abuso sexual infantil; de 9,4% de ocorrências de abandono de incapaz; de 8,1% da prática de maus-tratos; e de 7,8% nas taxas de agressão decorrente de violência doméstica.

Essa tendência pode ser explicada, em parte, pelo crescimento de 4,2% no número de adolescentes entre 12 e 17 anos mortos, com aumento concomitante da proporção da letalidade policial no total de casos. Em 2023, as MDIP correspondiam a 16,6% das MVI de adolescentes (12-17 anos). Em 2024, o percentual foi de 19,2%, um aumento de 15,7%.

Da mesma forma, os números mostram que os casos de bullying e cyberbullying continuam crescendo, com 2.543 e 452 registros criminais, respectivamente. As vítimas de bullying são, majoritariamente, crianças e adolescentes a partir de 10 anos – 46,8% entre 10 e 13 anos e 45,1% entre 14 e 17 anos. Já o cyberbullying predomina entre adolescentes de 14 e 17 anos, com 57,7% das ocorrências.

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública também considerou dados do último SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), relativo ao ano de 2023, para avaliar o cenário da violência nas escolas do país. Do total de escolas públicas respondentes do SAEB, 3,6% informaram que o calendário escolar foi interrompido durante vários dias devido a episódios de violência – crescimento de 245% em relação ao ano de 2021. Dentre os estados que apresentaram mais interrupções estão Rio Grande do Norte (29% das escolas) e Santa Catarina (7%), impulsionados por casos de ataques ao ambiente escolar e toques de recolher determinados por facções criminosas. Também aparece entre os estados com mais interrupções o Rio de Janeiro, com 8,7%.

 Impacto nos registros de armas

Com o fim da flexibilização da política de acesso a armamentos no Brasil, houve uma redução no número de novas pessoas registradas como Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CACs). Entre 2022 e 2024, houve queda de 79,4% nas concessões de certificados de registros para essas atividades, passando de 329 mil no último ano da gestão de Jair Bolsonaro para 67 mil novas licenças no ano passado. O ano de 2023 apresenta cenário atípico, com apenas 272 novos registros, devido à suspensão das licenças para aquisição e transferência de armas e munições de uso restrito por CACs, conforme o Decreto nº 11.366, de 1º de janeiro.

Já a fabricação de armas pela indústria nacional teve redução de 92,3% entre 2021, pico da série histórica, e 2024, além de uma queda de 95,1% na fabricação de fuzis. Além disso, o número de fiscalizações realizadas pelo Exército brasileiro aumentou 80,4% desde o fim da gestão Bolsonaro.

Financiamento da Segurança

Em 2024, o Brasil investiu R$ 153 bilhões em segurança pública, um crescimento de 6,1% na comparação com o ano anterior. A distribuição dos recursos segue com peso maior entre os estados, que aplicaram R$ 118,5 bilhões no setor contra R$ 21 bilhões do governo federal e outros R$ 13,5 bilhões dos municípios. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública aponta maior participação dos municípios nos gastos no setor, com crescimento de 58,2% dos recursos aplicados entre 2021 e 2024.

Em consequência das enchentes no Rio Grande do Sul, houve expressivo crescimento do gasto com defesa civil (224,4%) pela União, item que é enquadrado no orçamento da Segurança Pública. Devido a esse fator, as despesas da União cresceram em 22%. Das 10 cidades que mais receberam recursos para Defesa Civil em 2024, 9 estão no Rio Grande do Sul.

Outros destaques

A publicação aponta que houve aumento nas apreensões de drogas nos Estados e União entre 2023 e 2024. Quando se verifica a soma dos números das polícias estaduais, o incremento no volume de maconha apreendido foi de 21,5%, o que representa cerca de 1.416.943 quilos da droga. Já a quantidade de cocaína apreendida cresceu 10,1% (128.885 quilos). Os volumes apreendidos pela Polícia Federal também cresceram (+ 16% de maconha, ou 482.972 quilos); (+ 2,8% de cocaína, ou 74.501 quilos).

O Anuário mais uma vez traçou um quadro do setor de Segurança Privada, mostrando que havia 571.158 vigilantes com vínculos ativos até maio deste ano no Brasil, um crescimento de 7% na quantidade de postos de trabalho desde o ano anterior. É possível que essa elevação tenha relação com a publicação da Lei 14.967/2024, que reforça a fiscalização de trabalhadores clandestinos na área.

Já o número de pessoas privadas de liberdade foi 909.594, aumento de 6,3% na comparação com o período anterior. Foi apurado que há um déficit de 237.694 vagas – crescimento de 10,6% em comparação com o ano anterior; 94% das pessoas privadas de liberdade são homens; 68,7% são negros, e 20,3% da população prisional trabalha. Do total de presos, 13,5% estão em prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico.

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